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[RESENHA] Tête-à-Tête

O impacto da obra de Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre no pensamento moderno é inestimável, mas o casal de escritores-filósofos-existencialistas é lembrado igualmente pela vida que levou. Ambos eram brilhantes, corajosos, indivíduos profundamente inovadores.

Este livro mostra a paixão, energia, audácia, humor e contradições de seu notável e pouco-ortodoxo relacionamento. Mostra também, sobretudo, como a coragem e o brilho intelectual de Sartre e Beauvoir influenciaram de forma determinante o pensamento da época em que viveram.

Em 'Tête-à-Tête', a biógrafa Hazel Rowley nos oferece o primeiro retrato duplo dessas duas figuras colossais e sua intensa e turbulenta relação. Através de entrevistas originais e acesso a material inédito, Rowley os retrata de perto, em seus momentos mais íntimos e ainda conta pelo menos 28 casos extraconjugais do casal.

21/10/2019


Biografia focada na relação amorosa de Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir confirma a enorme influência do casal de escritores sobre o pensamento político e a moral de sua época. O lendário casal de escritores-filósofos Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre tinha uma relação notavelmente aberta, o que gerava controvérsias sem fim. Através de entrevistas originais e acesso a material inédito, a biógrafa Hazel Rowley nos oferece em Tête-à-Tête o primeiro retrato do intenso e turbulento relacionamento dessas duas figuras colossais.


Sartre e Beauvoir se conheceram em Paris, no ano de 1929. Eram dois jovens e brilhantes estudantes de filosofia.


A narrativa conseguiu extrair muito bem tanto a essência - literalmente existencialista - quanto os pontos-chave do legado filosófico-literário. Cada informação é bem referenciada ao final de cada capítulo, denotando uma pesquisa robusta acerca da vida e obra de Sartre e Beauvoir. Não é uma biografia seca, como um amontoado de informações datadas. É na verdade, uma biografia romanceada em que as personagens - talvez mais ainda pela realidade contida em seus nomes - tornam a leitura fantástica, leve e prazerosa. 
Durante seus anos juntos, Sartre escreveu sobre filosofia, criou peças de teatro, romances e tratados. Ele também ganhou o Nobel de Literatura em 1964, mas o rejeitou porque "consistentemente rechaçou todas as honras oficiais", segundo diz o próprio site do prêmio. De Beauvoir escreveu sobre ética, filosofia e o lugar das mulheres no mundo, obras que inspiraram uma geração pós-guerra dominada pela cena intelectual francesa.

Sempre tive a imagem de Simone de Beauvoir como uma mulher feita da dureza do aço, independente e que homem nenhum a pudesse dobrar. Por um lado existia a Simone, dura, engajada, preocupada com sua expansão intelectual e individual, braço direito de Sartre e por outro lado vemos uma mulher, com as mesmas questões que todas nós mulheres um dia já passamos.

Simone se sentiu traída, frágil e à beira da loucura por amor. E no decorrer da história que passeia com leveza entre a linguagem da biografia e do romance, havia uma Simone insegura com questões de beleza, ciúmes, infidelidades, perdões, privações e envelhecimento, numa devoção e endeusamento do homem que elegeu sendo o parceiro para toda a vida.


"Não existe um caminho traçado que leve o homem à sua salvação; ele precisa inventar incessantemente seu próprio caminho. Mas, para inventá-lo, ele é livre, responsável, autêntico, e todas as esperanças residem dentro de si". - Sarte

Durante a Segunda Guerra Mundial, Sartre foi chamado e seus jogos de sexo com Simone continuaram através de cartas. Deixada para trás em Paris, Simone continuou a seduzir homens e mulheres, escrevendo as descrições excitantes de suas atividades para Sartre, que revelam sua crueldade e a vulnerabilidade de suas conquistas. Quando ele finalmente voltou a Paris, a ignorou completamente e foi morar com sua mãe. Simone jogou-se no trabalho e, depois de uma visita pela América em 1947, escreveu seu livro mais importante, O Segundo Sexo.

Ela (Simone) não gostava de uma mulher americana -  naturalmente, a sua rival: Dolores Vanetti. E foi para se vingar de Dolores e Sartre que ela caiu na cama com o escritor Nelson Algren Chicago. Em alguns momentos, a forma como eles (Simone e Sartre) mentiam para seus amantes ou a forma como eles usavam as pessoas (sobretudo Sartre) me chocou. Mas, esse egoísmo não é também outro retrato de sua humanidade?


Beauvoir estudou Filosofia na Universidade Sorbonne, em Paris, onde conheceu o também filósofo Jean-Paul Sartre. Os dois mantiveram um relacionamento aberto, tido como polêmico até os dias atuais. A sua relação, baseada intensamente no amor intelectual, é fonte de admiração, embora também seja cheia de erros , como todo e qualquer relacionamento. Eu me encantei por Simone e me decepcionei com Sartre - um tanto arrogante e enganador em demasia. Enquanto ele recebia os louros de sua produções, brilhantes é claro, Simone muitas vezes era acusada de ser somente uma seguidora, não por culpa dele , mas da sociedade que se incomodava por aquela mulher tão segura, independente e apaixonante.

O feminismo e Simone de Beauvoir andaram lado a lado, a sua história, a força e a coragem dessa mulher, que ousou se impor e se destacar num mundo machista e preconceituoso. Ela rompeu os padrões de comportamentos submissos e conformados atirados sobre nós mulheres. Simone me ensinou a acreditar que eu posso e devo querer mais. Eu adorei a forma como autora humaniza Simone e Sartre, ela mostrou que acima dos erros e acertos de seus protagonistas, eles eram seres humanos. As 478 páginas desse livro são intensas e te prendem que não dá vontade de largá-lo. Sobretudo por ser uma história de amor.


“Querer ser livre é também querer livres os outros”.  Simone

O relacionamento tão aberto beirando entre a liberdade e libertinagem mesmo em se tratando de Sartre e Simone de Beauvoir ainda assim era patriarcal, havendo concessões por parte dela e nunca por parte dele. O curioso é que as concessões não eram cobradas, ela se privava de livre e espontânea vontade. Simone em suas relações tanto com Sartre quanto com seus demais amantes era sempre extremamente passional, porém, esses amores contingentes não poderiam riscar a estrutura de sua relação com Sartre.

A Beauvoir nas suas memórias conta quase tudo de seu pacto de vida com Sartre, que incluia os triângulos amorosos. Ela também descreve suas certezas e medos. Depois da morte de Simone, sua filha adotiva Sylvie Le Bon de Beauvoir publicou suas 'Cartas à Sartre' em 1990. As cartas causaram um frisson na França. Lá estava uma Beauvoir contando literalmente tudo seus romances com homens e mulheres  (em vida, ela sempre negara envolvimentos com mulheres). Suas opiniões sobre muita gente (incluindo sua irmã, a pintora Heléne de Beauvoir). Enfim, coisas que se falam em cartas escritas a um amante-companheiro-melhor amigo. Foi chamada de falsa, hipócrita e mentirosa. Mas, por quê? Ali, Beauvoir não defendia uma imagem pública, ela era ela mesma. Por quê mentiria a Sartre? 

A biógrafa australiana Hazel Rowley escreveu Tête-à-Tête baseada na memórias de Simone,em suas cartas, em seus diários (a maioria ainda não publicados), e em depoimentos de dezenas de pessoas que conheceram e conviveram com a escritora. Muito objetiva, sem se fixar no 'ídolo'Beauvoir, Rowley conta a trajetória da escritora desde o momento em que ela conhece Sartre,em 1929, até sua morte em 1986, de edema pulmonar. O livro analisa o ser humano, não a persona da escritora genial e da militante política. Ótima sugestão de leitura.

Eu amei o livro e senti pela morte de Sartre. Chorei por Simone e os amei intensamente por aquilo que eles tiveram de melhor, além do intelecto: seu amor pela liberdade, seu amor pela vida, sua humanidade e sua vontade de viver tudo agora ao mesmo tempo. 


Os ídolos também são humanos  
- amam, sofrem, mentem, dissimulam e traem -  
Como meros mortais.



 Sobre Simone: 


“Querer ser livre é também querer livres os outros”


A liberdade sempre foi uma das maiores preocupações de Simone de Beauvoir, que abordou o tema em livros como Por uma Moral da Ambiguidade. A frase descreve também o relacionamento com Sartre, que durou 50 anos. Os dois tinham uma relação aberta dentro da proposta de “pacto de liberdade”, para não se amarrarem um ao outro.

Quando morreu aos 78 anos em 1986, Simone de Beauvoir era uma unanimidade planetária. A mulher que rompeu tabus sexuais, literários, filosóficos e políticos havia se transformado em um modelo a se seguir, um estandarte vivo da modernidade à qual tantos aspiravam e ainda aspiram.

Foi enterrada ao lado de seu companheiro de 51 anos, o grande Jean-Paul Sartre (que falecera 6 anos antes), no Cemitério de Montparnasse em Paris. Após sua morte, Simone calmamente entrou, invicta e muito merecidamente, na História do Pensamento Filosófico. A autenticidade radical foi sua marca como pessoa e intelectual. Nada reprimia suas convicções políticas e do modo como escolhera viver sua vida. Aliás, uma vida semeada de lutas e incompreensões. Após a publicação de algumas de suas cartas a seu amante americano, o escritor Nelson Algren (Um Amor Transatlântico), sua imagem mudou de vez.

Os dois tinham muito em comum. Algren era um boêmio, um rebelde, um esquerdista e bebia tanto quanto Simone. Quando Simone descobriu a união de Sartre e Dolores, atordoada pela sua rejeição, se deixou levar por Algren. Ela tinha 39 anos, sem um amante durante muitos meses, e agora, pela primeira vez em sua vida, ela se apaixonou. Algren lhe comprou um anel de prata barata que ela usaria pelo resto de sua vida. Mas ele não estava preparado para a fidelidade de Simone a Sartre. Embora ela professou em muitas cartas que ela o amava apaixonadamente, ela não deixaria Jean-Paul. Simone e Sartre continuaram a se comunicar por cartas, encontros, escapadas. Eles nunca se abandonaram. Mesmo ambos terem relações sólidas e passageiras, a amizade e a admiração pela mente os uniam - Emergia então, a Beauvoir real, não somente a grande escritora e personalidade pública.


Como é deliciosa a leitura e como é linda a história de amor que se passa nessas páginas.






Adulto, Não Ficção| 478 Páginas| Editora Objetiva

Tête-a-Tête:
 Simone de Beauvoir e Jean Paul Sartre

Hazel Rowley

Ano 2006




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